O Peregrino de Terry Hayes (*****), livro de cortar a respiração, literalmente, uma trama genial engendrada com algo muito próximo de uma realidade que assusta o mundo, possibilidade sempre presente e ameaçadora de um ataque que poderá dizimar a população mundial, existe sempre uma "espada" apontada ao planeta, porque existe sempre o perigo iminente de uma destruição da civilização por meios terrivelmente tóxicos e mortais. Este livro leva-nos a uma situação limite, em que alguém, com intelegência, coragem e nascido para isso, consegue, in-extremis, evitar uma pandemia causada pelo vírus mais mortal, a varíola, geneticamente recriado para esse efeito. O causador, um extremista heróico de origem árabe que motivado em vingar a morte pública de seu pai por decapitação, na Arábia Saudita. Após a morte da mulher causada pelos sionistas, jurou definitivamente jogar tudo, não tendo contado com um adversário de outro mundo. Notável a descrição de algumas cenas de tortura e de engenho.

Peónia de Pearl S Buck (*****), livro maravilhoso que nos conta uma história de amor impossível no verdeiro sentido da palavra, amar sim, possível, mas impossível de se materializar dada as diferentes religiões e posições sociais, uma personagem linda, quase perfeita que dá o nome ao livro, consegue nos transmitir ao longo das páginas como se pode amar alguém, desde miúdo sem poder manifestar esse sentimento e simultaneamente ter forças para encaminhar quem ama para um caminho donde ela não faz parte. Uma serva chinesa em casa de judeus ricos na China, sentimentos verdades escondidas, comportamentos proibidos mas sem mácula, nunca os pondo em causa. Visóes diferentes do mundo causam feridas difíceis de sarar nas pessoas, muito por culpa do radicalismo religioso, dos preconceitos causados pela diferença de género, situação que se perpetua no tempo e que neste livro é contado de modo muito sensível.

Pensamento

Quando não existem inimigos no nosso interior, nenhum inimigo exterior nos consegue fazer mal.

Provérbio Africano

Os Guardiões de John Grishman (****), em primeiro lugar, escritor a repetir. Livro interessantíssimo pelo tema e modo como o aborda, basicamente uma história que, infelizmente, se repete e multiplica no mundo onde existe a pena de morte, um corredor com tantos inocentes a esperar por um desfecho do qual não conseguirão escapar. No entanto, este livro conta-nos excepções, pessoas que pro bono auxiliam até ao limite, condenados que eles acreditam e provam que estão inocentes. A grande preocupação não é encontrar o verdadeiro criminoso, se bem que seja também fundamental, é provar até à exaustão, a inocência da vítima de um julgamento parcial e de índole racista, preconceituoso e onde os interesses superam a humanidade e a verdade. Uma lição de tenacidade que termina, felizmente, em muitos casos, com sucesso e emoção.

Pensamento

Do rio que arrasta, diz-se que é violento. Mas ninguém chama violento às margens que o comprimem.

Bertolt Brecht

Pão com fiambre de Charles Bukowski (****), um retrato fiel da insastifação permanente de alguém (Henry), perante o mundo que o cerca e oprime.Tudo é negro, tudo é lixo, observa sempre o lado negativo das coisas e das pessoas. Nao cria laços com ninguém, não é atraído pelo sexo oposto e quando isso acontece, aborda-o de um modo violento e grosseiro. Sente-se declinar, refugiando-se na bebida, no conflito, na agressividade, na fuga de uma e para uma perdição que o persegue e machuca de maneira brutal. tudo isso, resulta de uma educação repressiva, negligente e ameaçadora, sobretudo por parte do pai, que ele acaba por ver reflectido em todos os relacionamentos. «Que desgastantes foram aqueles anos, ter a necessidade e o desejo de viver e não ter capacidade.» Livro escrito com humor cáustico e com uma linguagem crua e impenitente. O momento reproduz a altura da grande depressão no início dos anos trinta do séc.XX.

O enigma do quarto 622 de Joël Dicker (****), daqueles livros que estamos sempre distantes do final que se vai concretizar, um suspense criado numa rede de cruzamentos e paixões desencontradas, com muita ambição à mistura, uniões fracassadas, estranhos desaparecimentos, um crime perpetrado por alguém para o qual o autor nos foi afastando e iludindo. Um modo de escrever ao qual já nos habituou.

Pensamento

Tudo vale a pena, se não virar amor, vira poema.

Eva Luna de Isabel Allende (*****), um sonho de livro, mais um que Isabel Allende nos proporciona. Consegue tornar um drama, uma pobreza, uma constante fuga, uma incontornável história de luta, encontros e desencontros através de uma personagem, Eva, filha de um índio ferido e doente e de uma mãe de juba vermelha, Consuelo, numa doçura indescrítivel, numa prosa cheia de histórias queridas e próprias de uma autora única. Isabel Allende recupera o seu país através da memória e da imaginação. A cativante protagonista, Eva, constitui um  nostálgico alter-ego da escritora, pois também ela acredita que radica nas histórias o segredo da vida e do mundo. Filha da selva, do analfabetismo e da pobreza, luta tenazmente por conquistar o espaço no mundo, sem nunca perder o encanto feminino, tão ao jeito de Isabel Allende.

A Ilha de Ragnar Jónasson (****), ainda algo distante de uma Camilla Lackberg ou da dupla Lars Kepler, mas muito idêntico a uma Yrsa ou a um Nesbo, se me permitem a comparação, este escritor engrendra uma interessante história policial magnífica e que nos amarra permanentemente ao livro, li-o num ápice, com capítulos curtos que nos deixam constantemente a porta aberta para o seguinte. Muito suspense, protagonistas muito bem descritos e personalizados com uma maneira de ser vincada e que nos leva a uma ginástica mental para seguir o desenrolar da história até ao seu desenlace, com atenção e expectativa.

Pensamento

A solidão é perigosa e viciante. Quando damos conta da paz que existe nela, não queremos mais lidar com pessoas.

A Rapariga que Sobreviveu de Leslie Wolfe (*****), muitíssimo agradado com este livro de Leslie Wolfe, o primeiro que li desta escritora, também um policial, também com suspense, também um thriller, também com adrenalina, igualmente com capítulos curtos que dão para uma pausa reflectiva. Mas diferente em relação a outros do mesmo género literário, porque nos coloca perante a descrição alternada do pensamento, que vai decorrendo ao longo da história, da investigadora e seu staff, por um lado, do psicopata e serial killer, pelo o outro, da potencial e eminente vítima, e não obstante o clássico final surpreendente, acompanhamos o que vai na mente de cada protagonista com um toque magistral de emoção.

Um Lobo nunca abandona a Alcateia de Catarina Fernandes Oliveira (***), lido rapidamente dada a simplicidade da escrita e até alguma infantilidade, onde basicamente a mensagem que passa é a amizade. Uma história juvenil contada num mundo do fantástico, ou melhor, entre dois mundos, o humano e o dos heróis, indivíduos jovens noutra dimensão que possuem poderes sobre-humanos, onde se gera a tal união e amizade. Divertida, com humor, imaginação, escrito por uma autora ainda muito jovem e estreante, que vai com certeza crescer com o seu ideal de escrita.

Pensamento

Um livro é um brinquedo feito com letras. Ler é brincar:

                              Ruben Alves

O Menino de Cabul de Khaled Hosseini (*****), chorei, é verdade comovi-me com este arrebatador livro, de uma força esmagadora, conta-nos uma dramática história de algo difícil de descrever, mas que Hosseini ultrapassa genialmente. Uma amizade entre dois meninos em Cabul, de condições sociais e etnias diferentes, que cresceram juntos, partilhando todos os momentos, amor, ciúme, brincadeiras, ambos protegidos por uma personagem forte e segura, o pai de Amir, o proprietário rico mas samaritano, e Hassan, filho do criado desde sempre de Baba, o Ali. Num país fustigado por constantes conflitos, guerras, mortes, de uma pobreza assustadora, a que se seguiram a invasão dos russos, o aparecimento dos arrasadores Talibãs, tudo se desmoronou mais depressa, mas a causa principal da separação entre eles foi a mente, o medo, a cobardia, o que causou em Amir um vida cheia de arrependimento e do querer voltar atrás na mentira sempre viva. O fim leva-nos, após uma incontável e persistente odisseia, surge uma luzinha de amor, o filho de Hassan, entretanto morto, sobretudo quando a verdade prevalece. 

O Homem que Gostava de Cães de Leonardo Padura (*****), genial livro de um autor que se demonstrou exímio na escrita deste livro que reproduz a gigantesca fraude que foi a tomada do poder por Estaline, adulterando os objectivos da revolução de 1917, esta já de si violenta para fazer cair um regime injusto e autocrático dos Czares. Lenine e Trotsky lideraram, desde o primeiro momento, sem piedade uma guerra para impôr um regime comunista, que originou imensas vítimas. Mas o reverso da medalha estava para vir, o descalabro do regime, as perseguições, os assassinatos, as condenações brutais, as torturas sobre tudo e todos os que Estaline sonhava que estariam contra ele. Neste livro, o livre arbítrio sobre Trotsky, perseguido, exilado e morto por um mercenário (Ramon Mércader) no México, um indíviduo treinado, inoculado com ódio contra o que a vítima defendia, que era uma nova política que retomasse o regime que sonhava, que foi completa, absurda e violentamente desvirtuada. Milhões de mortos, a família de Trotsky morta até ao seu próprio fim, que ele já aguardava. E no fim, o que conta, as pessoas!? esquecidas, empurradas pelo medo para a miséria, para o exílio, para o sofrimento, para a morte, "fodidas" como diz o contador de histórias, Ivan.

O Invasor de Marçal Aquino (*****), livro pequeno em tamanho, mas enorme em dimensão literária. Parece simples escrever uma história simplista, uma trama infelizmente usual, contratar alguém para se ver livre de outrém que surge como obstáculo ao pretendido, mas Marçal, transforma com humor, linguagem fluente e descabelada, muito diálogo e umas nuances bem delineadas, um pequeno livro numa deliciosa companhia. Ivan, Alaor e outros, personagens que nos acompanham em linhas que nos prendem.

Olive Kitteridge de Elisabeth Strout (*****), adorei este livro violento emocionalmente. A personagem central, Olive, uma ex-professora de uma pequena povoação americana, daquelas que toda a gente se conhece e comenta, descreve em capítulos bem delineados em temas, pessoas e épocas, várias vidas de vizinhos, conhecidos, amigos e família, de modo sempre contundente, crítico, malicioso, distante, chegando a ser frio. Daquelas pesssoas que nunca pediram desculpa ao longo da vida, sendo até para ela própria extremamente dura. Será dos melhores livros que li, no pressuposto que se trata simplesmente de uma história por todos vivida, mas que só pessoas inspiradas como esta autora, podem contá-la de modo tão assertivo, cru e até divertido em simultâneo.

Pensamento

Saudade é chuva que nos molha por dentro.

Comentários

10.09.2020 15:28

Rui Mateus

Pão com fiambre de Charles Bukowski, um excelente livro e Eva Luna de Isabel Allende...duas excelentes escolhas mano.😊